Ritual

quero tocar-me.
a minha pele
onde guardo as memórias,
(quais?)
nela, o que sei de mim
toco-me.
deslizo dedos
molhados de saliva
e a pele é animal arisco
arrepia-se, elétrica
(tesão)
toco-me
presença feita de luz
é superfície trêmula contra a pele quente
(sinto)
invento lembranças marcas gozos
e flores
toco-me.
do jeito que sabes
perto da janela
(esvoaçante)
exposta a olhares
em ritmos aquosos
palpitantes
(presença entumescida)
toco-me
na madrugada insone
silenciosa
percorro relevos
rios e fontes
mergulho profundo
(respiração entrecortada)
reverbero em camadas 
suspensa
e existo em mim.

[poema apresentado no Sarau Maroto | Lisboa 18 Out 24]

natureza despedaçada

if nature dries up, the aridity is ours
if the forest burns, we burn
if flight ceases, we plummet
we die
slowly
of shame
of boredom
of exhaustion
petrified
in agony
sleepless
motionless
shattered
by horror
convinced
that it’s not us

se a natureza seca, a aridez é nossa
se a floresta queima, queimamos nós
se o voo cessa, despencamos nós
morremos
lentamente
de vergonha
de tédio
de cansaço
petrificados
em agonia
insones
inertes
despedaçados
pelo horror
convencidos
de que não somos nós

Como da primeira vez

“Pergunta-se se ela conseguirá vislumbrar outro mundo para além da rachadura; para além do desencanto, para além da secura.”

[excerto do meu conto Como da primeira vez, na antologia LIBERDADE MINIMALISTA, 2024]

Minimalista

REIMAGINED

Do you feel what you see
Or do you just look?

And when the questions are over? REIMAGINED is the rewriting and reimagining by Ana Gilbert of the book of poems by Paulo Kellerman E quando acabarem as perguntas?, published in 2022.

42 poems by Paulo Kellerman
44 photographs by Ana Gilbert

4 poems (voice and original text in Portuguese) by Paulo Kellerman + Soundscapes by POROS (via QR Code)

Design | Licínio Florêncio
Print | Arte Ampliada
Handmade binding | Eliana Yukawa | Yume Ateliê & Design

7 anos de Sutilezas…

SUTILEZAS DO OLHAR | 7

Sete anos do blog, este lugar silencioso por onde as pessoas passam e deixam suas marcas, ainda que não se manifestem. Sim, sinto-as por cá e o anonimato é, de certa forma, fascinante.
O blog evoca um tempo sem tempo, a ideia de pausa ou de suspensão, como uma paisagem, onde nos demoramos antes de voltar à estrada.

Obrigada a todas e todos que olham por esta janela, que muitas vezes se vêem refletidos nela, que se permitem pausar e tentar apreender aquilo que nem sempre sei dizer.

E consumida de linhas
Enovelada de ardência
Te aguardo às portas da minha cidade
.”

Hilda Hilst (Cantares)

Seven years of the blog, this silent place where people pass by and leave their marks, even if they don’t express themselves. Yes, I can feel them here, and the anonymity is, in a way, fascinating. The blog evokes a timeless time, the idea of a pause or suspension, like a landscape where we linger before returning to the road.

Thank you to everyone who looks through this window, who often sees themselves reflected in it, who allows themselves to pause and try to grasp what I don’t always know how to express.