observação

observo a lentidão do teu gesto.
[o toque suave da renda]
a mão pequena
[onde cabe o mundo]
o corpo desnudo
[o desejo a descoberto]
observo as articulações que se movem
[hipnótico]
dedilham memórias que espreitam inocentes
[indecentes]
feitas de luz
[sombra]
deixam a pele marcada
[cicatrizes inexistentes]
pela eternidade
[dolorosa]
dos encontros imprecisos
[improváveis]

Haiku

blossoms kiss bare skin
a prelude to sweet passion
morning comes too soon


Frederick Fullerton

Nude #7

White room whose walls,
having neither planes nor curves nor angles,
are composed of a continuous satiny white membrane

like the flesh of some interior organ of the moon.
It is a living surface, almost wet.
Lucency breathes in and out.

words by Anne Carson (Glass, Irony & God)

Fotografar palavras #3834

Dizes que o teu corpo sonha,
Que os teus dedos sonham
A tua pele,
Os teus lábios.

Dizes que o teu coração sonha.

E os teus olhos.
Dizes que os teus olhos sonham tanto,
Mas tanto,
Mesmo quando estão fechados.
Especialmente quando estão fechados.

Como sangue,
Dizes tu.

Sorris e explicas
Que o teu corpo está repleto de multidões de sonhos
Entranhados nas tuas células.
Do lado de dentro das células.
Na alma de cada uma das células.

Sorris
E explicas que são esses sonhos que te dão vida.
Como se fossem sangue.

Um fluxo permanente e imparável
De sonhos.

Gostava de te fazer uma pergunta:

Se o teu corpo tem em si todos esses sonhos,
Porque não os sinto quando me beijas?

Apenas me dás saliva.
Não sinto sangue
Nem sonhos.


[You say your body dreams,
your fingers dream
Your skin,
Your lips.

You say your heart dreams.

And your eyes.
You say your eyes dream so much.
But so much,
Even when they are closed.
Especially when they are closed.

Like blood,
You say.

You smile and explain
That your body is full of multitudes of dreams
Ingrained in your cells.
Inside the cells.
In the soul of each of the cells.

You smile
And explain that those dreams are what give you life.
As if they were blood.

A permanent and unstoppable flow
Of dreams.
I would like to ask you a question:

If your body has all those dreams in it,
Why can’t I feel them when you kiss me?

You just give me saliva.
I do not feel blood
Nor dreams.]

Texto | Text: Paulo Kellerman
Fotografia | Photography: Ana Gilbert

Fotografar palavras

Cumplicidade bonita entre palavra e imagem, entre literatura e fotografia, entre escritores e fotógrafos. Dose diária de poesia, desde 2016.

O canto

Há sempre um momento em que sente no seu corpo: vão cantar; e nesse instante, os pássaros cantam. Serão eles que mantêm o mundo em movimento com o seu canto?

[There is always a moment when she feels in her body: they are going to sing; and in that instant, the birds sing. Are they the ones who keep the world moving with their singing?]

Paulo Kellerman