
“Era ela com ela.”
[a respiração do tempo]
Uma publicação Minimalista Editora
Ao escrever sobre o livro, “A respiração do tempo”, detenho-me no título. O tempo como organismo vivo. Que respira.
Reparem que não há humanos sem tempo. O tempo é uma estrutura essencial. E este livro começa logo por evidenciar isso.
O livro, muito cedo, entra pelo desejo, na sua relação com a imaginação, ou com a fantasia. Mostrando como o êxtase precisa dessa centelha para existir.
E vai por ali fora, sempre poderoso. Mostra-nos não aquele humano perfeitinho, mas aquele que sofre e faz sofrer. Aquele que por vezes vive quase sem poder.
O prazer e a dor estão muito presentes na narrativa.
É um livro carregado de interioridade. Com a psique das personagens muito à mostra.
Não estamos perante personagens planas, sentimos a sua riqueza e toda a força das suas circunstâncias. Vou dar um pequeno exemplo:
“Uma mulher observa a cena e, como os cães, fareja a ameaça. Ela, uma dessas mulheres violadas por seu homem. Ela e o seu grito mudo.
Ao sinal invisível, os homens começam a disparar. Descarregam armas, como uma ejaculação colectiva, fruto de um gozo inominável.”
A água é também um elemento constante. Há uma qualquer relação entre o mar e a morte. Que vai sobrevindo.
É um livro que tem arrojo, risco por parte da sua autora. Exposição. Verdade.
Na linguagem tem a sua música. As suas escolhas. Uma pontuação própria. Um sentir da língua, em balanço, em movimento.
Tenho uma teoria: um livro interessante tem de partir de alguém interessante. E este livro é mais uma demonstração desta minha teoria. Quanto deste livro é esta autora? O que pensa? Como pensa? O que observa? O que encontra? Que detalhes? Que linguagem? Que relações estabelece entre tudo?
O livro beneficia de toda essa riqueza.
Por todas estas razões, e aquelas ainda por descobrir (porque cada leitor fará o seu livro), é uma boa ideia ler este “A respiração do tempo”.
XXIV
Finalmente entendi
Por que motivo algumas pessoas se suicidam.
Foi ontem:
Acordei abruptamente e soube que não conseguiria voltar a dormir.
Soube que tudo o que havia a fazer era deixar-me estar quieto.
Esperar.
Sentir o tempo passar
E remoer os pensamentos.
Os mesmos pensamentos de sempre,
Um após outro.
O desfile completo,
Previsível,
Imparável.
Remoê-los devagarinho uma vez mais.
E uma vez mais,
Chegar a lado nenhum.
Será que algum pensamento pode
Algum dia
Conduzir a algum lado?
O meu sonho maior é conseguir dormir
E durante o sono sonhar que estou acordado e livre de pensamentos.
Mas o desfile nunca pára.
E há momentos,
Como ontem,
Quando acordei abruptamente e percebi que não conseguiria voltar a dormir,
Há momentos
Em que fico um pouco desesperado.
Só um pouco.
Mas e se um dia ficar muito?
Foi então que telefonei para te dizer:
Finalmente entendi
Por que motivo algumas pessoas se suicidam.
É quando o pouco se transforma em muito.
Sim,
Eram quatro da manhã e estavas a dormir.
Mas a pergunta não me saía da cabeça,
Precisava de verbalizá-la:
E se um dia ficar muito desesperado?
Desligaste o telefone,
Voltaste a dormir.
O que sonhaste?
E QUANDO ACABAREM AS PERGUNTAS?
Edição Sem Editora
[a poesia inquietante de Paulo Kellerman]
A RESPIRAÇÃO DO TEMPO | Sinopse
Os fios do tempo, como artérias do corpo, como galhos rizomáticos, espalham-se, pulsantes, em forma de palavras. Peso e leveza, prazer e dor, angústia e sentido. Perda, encontro, memória. Lugares luminosos e sombrios da alma. Os contos de A Respiração do Tempo atravessam esses temas, numa costura quase imperceptível, mas inquietante. Evocam um repertório de imagens, um catálogo de sensações, pensamentos e emoções que permeiam as relações humanas.
Uma publicação Minimalista Editora
Encomendas: minimalista.editora@gmail.com
“Vivo a promiscuidade das palavras. As quero todas em mim e ao mesmo tempo…”
Projeto: Paulo Kellerman
Texto: Samantha Buglione
Fotografia: Ana Gilbert
E QUANDO ACABAREM AS PERGUNTAS?
Edição Sem Editora
O Paulo tem a poesia no olhar, e tem a capacidade de criar inúmeras imagens com as palavras: imagens belas, todas, algumas terríveis em sua beleza. Gosto de como fala das relações humanas (e nos poemas não é diferente); de como o relacionar-se com o outro envolve o relacionar-se consigo mesmo. E do tom melancólico que os poemas carregam, mesmo que de forma muito sutil (junto com a sedução, a paixão, a curiosidade, a leveza). No livro, há uma busca interna profunda, desesperançada até, mas há também a vontade de seguir… porque não se pode abandonar a morte (das coisas, das relações, dos momentos, a nossa), porque isso seria abandonar a vida (com tudo o que ela provoca e permite). Vida e morte, sempre juntas; a angústia disso, a plenitude disso.
Ilustração: Maraia
XXXIX
Não sei o que prefiro:
Se o beijo
Ou aqueles três segundos que antecedem o beijo.
Aqueles três segundos em que tudo é certeza
E desejo,
Destino e inevitabilidade.
Os três segundos que parecem explicar e justificar
A existência do Universo,
E dar sentido à vida.
Preferes o beijo ou os três segundos que o antecedem?
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E QUANDO ACABAREM AS PERGUNTAS?
Edição Sem Editora
[a delicada poesia do Paulo Kellerman]
XLII
O prazer é luz
E o pensamento é sombra.
Quero arder.
E tu?
E QUANDO ACABAREM AS PERGUNTAS?
Edição Sem Editora
[a poesia de Paulo Kellerman]