
EXPOSIÇÃO | de 21 de maio a 21 de junho de 2021
com o Coletivo Engasga Gato [Centro de Artes, Universidade Federal de Pelotas]
Visitação: acesse aqui

EXPOSIÇÃO | de 21 de maio a 21 de junho de 2021
com o Coletivo Engasga Gato [Centro de Artes, Universidade Federal de Pelotas]
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“Distanciamento necessário ou social, respeitando a fila já acostumada ao nosso quotidiano. À minha frente, um livro gasto e cansado nas mãos de um rapaz que se adivinham beber-lhe a história. Ri-se apenas de olhos, franze o sobreolho, olha para o ar à sua volta na esperança de encontrar um olhar cúmplice e encontra. Ri-se apenas de olhos novamente. À sua frente constrói-se uma conversa de telemóvel sobre o futuro do dia que ainda é apenas de manhã. Atrás de si, eu, de ouvidos postos na música e de olhos postos no vazio da chuva que retoma a sua missão de repovoar o chão de gotas e os cabelos de água. A fila avança sem destruir as horas, já faz parte delas, como o tempo.”
Fotografar palavras
Projeto | Paulo Kellerman
Texto | Elisabete Neves
Foto| Ana Gilbert


“I have saved this afternoon for you”
Palavras | T.S. Eliot (Portrait of a lady)



“Desligo-te.
A vaga ideia de ti, paira
como um novelo de ontens.
Promessas de páginas confinadas na agenda.
Da mão, caem-me as massinhas da canja
que te faria amanhã.
Baralham-se as letras,
Esqueço o teu nome.”
Fotografar palavras
Projeto | Paulo Kellerman
Texto | Pale Pink
Fotos| Ana Gilbert

Vermelho-sangue, vermelho-vida, vermelho-alma, vermelho-irmandade, vermelho-encontro, vermelho-gente… aqui, lá, em qualquer lugar…


“To give, indefinitely, to our human finitude, a form that is never definitive.”
Didier Anzieu (The skin-ego)

“Quem somos quando não somos nós?”
Palavras | Mónia Camacho (Um tigre à porta da Sé)
Esta pergunta ecoa por todo o livro da Mónia Camacho. E lateja dentro de mim. Convida-nos a percorrer o caminho em busca do que somos, de como nos definimos perante nós mesmos e os outros, e a pensar sobre o ato da escrita. Leva-nos a refletir sobre as fronteiras que criamos numa tentativa de nos dar contornos e de nos proteger do outro, mas que podem sufocar com acúmulos que não dizem de nós. Somos o que imaginamos ser? Podemos imaginar o que somos? Reescrever o que somos?


“Tinha os próprios abismos para transpor.”
Palavras | Andreia Azevedo Moreira (As paredes em volta)
A cada leitura do livro da Andreia Azevedo Moreira, vou descobrindo camadas, retirando véus de desconforto para encontrar a crueza de realidades psíquicas traumáticas e a busca por paredes (concretas ou imaginárias) que possam conter a dor. A escrita da Andreia explicita aquilo que não pode ser pronunciado em voz alta.


“14 dias a conta gotas. Cada dia é uma gota. 24 horas a cair e a desaparecer. Gosto de fingir que não entendo a sua finitude, a sua não importância, explicando-a desta forma: 24 horas a cair e a desaparecer. Afinal, o que é uma gota num oceano? É um oceano mais uma gota. Simples.
Lá fora, o frio e as feridas em sangue, em patas que já não suportam o peso. Amor sem retorno que já não se queixa de dor. Cá dentro, a lareira, dois gatos e a falsa sensação de calor. Do outro lado da rua, a insegurança. O tempo em modo decrescente. Fora dos limites geográficos do meu ninho, a ideia vaga de um oxigénio rarefeito em bolha de marfim. Impossível de respirar. O marfim é uma pedra. A pedra não tem pulmões. Nem cérebro. Nem coração. Tem apenas um corpo frio e duro. Um corpo sem pulmões não mexe. Move-se apenas com a ação conjugada de forças, mas não dança.
24 horas a cair e a desaparecer. Os meus dias em forma de gota. A ideia bonita dos dias transformados num imenso azul. É nisso que me detenho enquanto violento as insónias, quase diárias. Talvez assim custe menos ignorar a trágica ideia da gravidade. Recordo a ironia da maçã na vida de Newton. Poderia ter sido uma laranja, mas não foi. Uma melancia certamente seria uma falácia científica. Não levaria a lado nenhum. As melancias crescem na terra. As abóboras também. Ambas flores de uma terra que engole e deglute, mais tarde, corpos que não são pedras. Muito menos pedras de marfim. Essas ficam inalteráveis. Corpos quentes e moles. Corpos providos de pulmões que respiram. Uma idiossincrasia humana, enquanto a sorte o ditar. Questiono-me se os pensamentos também podem cair e desaparecer. A Elis Regina e o Nick Cave no gira-discos e um estômago alérgico a noticiários, dizem-me que sim.”
Fotografar palavras
Projeto | Paulo Kellerman
Texto | Rita Rosa
Foto | Ana Gilbert

“As coisas que guardei e as coisas que esqueci; no fundo é assim que construí aquilo que sou, a minha identidade; aquilo que guardo na memória acaba por ser aquilo que me define.”
Paulo Kellerman (Aviões de papel)
Uma edição Minimalista

“Hoje caminhamos de mão dada sem medo de nos perdermos. Ambos sabemos que foram os caminhos sem saída que nos juntaram…”
Fotografar palavras
Projeto | Paulo Kellerman
Texto | Liliana Silva
Foto | Ana Gilbert

“Invento para me conhecer.”
Manoel de Barros (Menino no mato)

“Eu sou eu e minha circunstância.”
Palavras | Ortega y Gasset

A linha que nos separa.

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“Sei caminhar sem pegadas, desaparecer em mim.”
Fotografar palavras
Projeto | Paulo Kellerman
Texto | Rita Moreira
Fotos| Peter A. Gilbert e Ana Gilbert

“Eu no espelho:
atentas, nós duas,
rostos que excedem nossa imagem,
estendemos a mão, espalmamos os dedos nesse pó
de gelo. Sabemos: quando eu mergulhar daqui,
e do seu lado, ela,
hão de girar ao sopro da voragem
todos os meus sonhos, e os sonhos dela.
Labirinto de espelhos, reflexos de reflexos,
eu e ela continuamos sós.”
Palavras | Lya Luft (Mulher no palco)

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“Talvez eu seja
O sonho de mim mesma.
Criatura-ninguém
Espelhismo de outra
Tão em sigilo e extrema
Tão sem medida
Densa e clandestina
Que a bem da vida
A carne se fez sombra.

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Talvez eu seja tu mesmo
Tua soberba e afronta.
E o retrato
De muitas inalcançáveis
Coisas mortas.

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Talvez não seja.
E ínfima, tangente
Aspire indefinida
Um infinito de sonhos
E de vidas.”
Palavras | Hilda Hilst (Cantares de perda e predileção, XLVI)
(obrigada, R. R.)

“Se te pudesse respirar
inspirava-te…
Ou então temporizava-te
para o teu coração gritar
quando me soprasses
na alma.”
Fotografar palavras
Projeto | Paulo Kellerman
Texto | Rute Violante
Foto| Ana Gilbert

“Nada do que somos nos pertence.”
Texto: Elsa Margarida Rodrigues

“Um filme do qual não fazia parte do guião. Tudo decorria sem que estivesse ali. Sucessão de movimentos sem sentido. Ruídos transformados em silêncio numa mente vazia pelo tanto que absorveu. O sítio de sempre, tão diferente do que alguma vez tinha sido.
As mãos. O espaço vazio entre os dedos. Há quanto tempo estaria assim, por preencher? Há quanto tempo segura a reminiscência do que partiu? É por onde começamos a sentir que adiamos deixar de o fazer, que prolongamos um mundo porque existem memórias que ainda precisam de viver.
Não deu conta de ir. Caminhos de sorrisos, de incontáveis palavras que mesmo sem voz se faziam ouvir. Não deu conta de voltar. Chegada bem distante da partida, desconhecendo-se a si e onde veio parar…”
….
Fotografar palavras
Projeto | Paulo Kellerman
Texto | Catarina Vale
Foto | Ana Gilbert